ENTRE MACEIÓ E HOUSTON

Marcos Pontes
27/08/2006

 

Na semana passada estive no Brasil. Visitei 4 cidades. Conversei com muita gente. Escrevi muitas mensagens. Autógrafos, fotos, sorrisos, abraços, pessoas amigas.
A viagem começou de modo peculiar. Cheguei na manhã da sexta-feira no aeroporto de Guarulhos. Manhã bonita, sensação boa de estar em casa. Desci do avião. Passei pela conferência de passaportes. Antes de seguir para a esteira de bagagens, parei um instante para ir ao banheiro. Não deveria ter feito aquilo!
Pessoas passavam apressadas. Muitas delas. Rostos cansados da viagem longa. Seguiam no ritual comum da chegada. Pensavam nos encontros, na comida de casa, na dor nas costas, nos presentes que faltaram. Seguiam para as bagagens. Eu também fui.
Ao redor da esteira, expectativa aglomerada. As malas desfilavam. Grandes, pequenas, coloridas, laços vermelhos, fechos arrebentados. Muitos olhos atentos acompanhavam o cortejo.
Com o tempo, uma a uma, as pessoas foram recolhendo seus pertences e indo embora. Felizes reencontros.
Depois de uns vinte minutos, restaram poucos de nós. Compartilhávamos olhos preocupados e frustrados.
Nossas malas não estavam ali. O que teria acontecido? “Por quê? Logo a minha?”, pensávamos.
Convencidos do infortúnio presente, formamos fila no balcão de reclamação. A atendente, simpática, tenta justificar e motivar: “Deve ter havido um problema de etiqueta. Não se preocupem, hoje ou amanhã elas estarão aqui!”
Balançamos a cabeça desanimados, pensando nos desencontros, nos banhos sem trocar de roupa, na dor de cabeça, nos presentes que faltaram.
Na esteira ficaram algumas malas abandonadas. Entre elas, uma idêntica a minha. Indicação clara de que alguém poderia ter se enganado e saído, despreocupado, carregando minha bagagem... difícil saber para onde!
Eu, por minha vez, sai dali com um papel, um código, um número de telefone e uma promessa.
No saguão, encontrei meus amigos, já preocupados com o atraso. Explicações, gozações, coisas naturais. Seguimos de carro para o CTA (Comando–geral de Tecnologia Aeroespacial da Aeronáutica) em São José dos Campos. O primeiro compromisso era um encontro com cerca de duzentos estudantes no MAB (Memorial Aeroespacial Brasileiro). Chegamos ao Hotel de Trânsito do CTA com algum tempo de folga. Suficiente para comprar um novo aparelho de barbear, escova de dentes, etc.
A conversa com os estudantes foi emocionante. Ali, naquele ambiente onde o passado e o futuro se misturam na idéia de “realizar pelo Brasil”, foi gratificante ver a empolgação dos alunos e de seus professores. No grupo, reencontrei meus jovens companheiros de pesquisa dos dias de minha primeira missão ao espaço: os integrantes da equipe responsável pelo experimento educativo com os feijões. Eu e todos os presentes pudemos ver claramente que os resultados daquela experiência educativa, tão simples, terão magníficos e incalculáveis frutos, multiplicados por corações motivados, ainda por muitos e muitos anos. Fiquei feliz. “Eu participei. Eu fiz a minha parte.”
A noite, ainda em São José dos Campos-SP, participei de atividades comemorativas da ABCAer (Associação Brasileira de Cultura Aeroespacial). “Resgatar a história, preservar a cultura e disseminar o conhecimento aeroespacial”, sem dúvida nenhuma, a ABCAer tem uma tarefa muito especial, bonita e exemplar no contexto atual brasileiro. Precisamos de mais iniciativas como esta. Não podemos deixar nossa história ser escrita na areia da praia, privando as gerações futuras do conhecimento e das razões de orgulho pelas suas raízes brasileiras.
No dia seguinte, sábado, mais emoções. Fiz uma palestra para centenas de alunos do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), escola de reconhecimento mundial, que também tive o prazer de freqüentar. Enquanto mostrava e comentava peculiaridades da carreira que abraçamos, pude ver e sentir a vibração, a energia positiva, a garra dos nossos futuros engenheiros. Boa sensação. Senti confiança. Serão eles que estarão liderando projetos no Brasil e exterior em alguns anos. Tenho certeza de que terão muito sucesso...e podem contar comigo, como sempre.
Domingo, pela manhã, fomos de carro para Cerquilho-SP. Participamos do encontro nacional de Rádio Amadores para a entrega de prêmios e troféus do Concurso Brasileiro de 144 MHz. Dia de sol, céu azul. Lindas paisagens desse meu interior de São Paulo. Plantações, colinas verdes, terra vermelha, terra branca. Saudades de Bauru!
No encontro, conversei durante 3 horas com colegas rádio amadores (sou o PY0AEB) e professores. Duas categorias com grande importância na “disseminação e motivação do conhecimento”. Lembrei dos dias a bordo da Estação Espacial, dos momentos em que tive a satisfação de poder conversar com meus compatriotas através do rádio. Difícil de explicar, mas só quem esteve em situação semelhante pode imaginar completamente o bem que faz poder falar, mesmo que por alguns minutos, no seu próprio idioma. Um detalhe que poucos sabem: o rádio amador é oficialmente considerado uma alternativa de comunicação no caso de falha dos sistemas primários de comunicação da EEI com o solo.
Regressei a São Paulo após o evento. Coloquei minha calça jeans, a escolha não foi difícil pois era a única opção, e seguimos para Maceió-AL. Chegamos de madrugada.
Ponta Verde, Ponta Negra e tantas outras de magnífica beleza! Praias lindas, coqueiros, mar azul, povo maravilhoso. Conferi sua beleza novamente pela janela do hotel e do carro, enquanto seguíamos para as atividades junto ao encontro do CONFEA (Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia). A finalidade do evento era o estudo de propostas para o desenvolvimento do Brasil. Pela manhã, falaram os “presidenciáveis”. A tarde, na minha oportunidade de falar, enfatizei o tema da educação e a importância fundamental que tem, em minha opinião, para o desenvolvimento do País.
Após falar durante quase duas horas sobre o assunto, me encontrei com o público: conversas, autógrafos, sorrisos e muitas fotos no estande montado pela Agência Espacial Brasileira para a exposição. É muito bom ver o interesse pelo Programa Espacial, sentir o carinho e a energia da nossa gente. Isso nos motiva e nos faz seguir, apesar de tudo, nessa luta diária na busca de um futuro melhor para o país, seja na área espacial, seja na educação, seja na busca da maior compreensão entre as pessoas. Ao País, o que importa mesmo, é que façamos a nossa parte...todos nós!
Na terça, encontrei finalmente com minha mala no aeroporto de Guarulhos e voltei para Houston. Ela, “a mala” também chegou naquele dia!

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